O meu desejo é fugir. Fugir ao que conheço, fugir ao que é meu, fugir ao que amo. Desejo partir - não para as índias impossíveis, ou para as grandes ilhas ao Sul de tudo, mas para o lugar qualquer - aldeia ou ermo - que tenha em si o não ser este lugar. Quero não ver mais estes rostos, estes hábitos e estes dias. Quero repousar, alheio, do meu fingimento orgânico. Quero sentir o sono chegar como vida, e n, ão como repouso. Uma cabana à beira-mar, uma caverna, até, no socalco rugoso de uma serra, me pode dar isto. Infelizmente, só a minha vontade mo não pode dar.
A escravatura é a lei da vida, e não há outra lei, porque esta tem de cumprir-se, sem revolta possível nem refúgio que achar. Uns nascem escravos, outros tornam-se escravos, e a outros a escravidão é dada. O amor cobarde que todos temos à liberdade - que, se a tivéssemos, estranharíamos, por nova, repudiando-a - é o verdadeiro sinal do peso da nossa escravidão. Eu mesmo, que acabo de dizer que desejaria a cabana ou caverna onde estivesse livre da monotonia de tudo, que é a de mim, ousaria eu partir para essa cabana ou caverna, sabendo, por conhecimento, que, pois que a monotonia é de mim, a haveria sempre de ter comigo? Eu mesmo, que sufoco onde estou e porque estou, onde respiraria melhor se a doença é dos meus pulmões e não das coisas que me cercam?
POIS É PARA QUE NÃO SE TORNE ESCRAVO QUE SE DEVE EXTRAPOLAR NA FEITURA DOS GOSTOS. DOS PRÓPRIOS GOSTOS. QUANDO EU ERA MENOS ANTIGA, DIZIA SEMPRE QUE MINHA VONTADE IMENSA ERA A DE CONSTRUIR UMA ROTINA, COM VISITAS AOS SUPERMERCADOS, ÀS QUARTAS-FEIRAS PÓS-EXPEDIENTE, E MERGULHO DOS PÉS EM ÁGUA MORNA, NO QUE CHEGASSE EM CASA.
E NO PRINCÍPIO DA EPOPÉIA LABORAL (QUE SE ESTENDE, ASSIM, ELA ESTÁVEL, POR CINCO ANOS), OS SAPATOS MAIS ALTOS DE FATO ME INCOMODAVAM, E AS ROUPAS MAIS OCASIOSAS, E AS TARDES SOPORÍFERAS (PARA USAR VOCÁBULO DO MEU HÁ-MUITO-DESAPARECIDO SASSÁ) PONTUADAS POR REUNIÕES COM UM CHEFE DESAGRADÁVEL E OLEOSO. E NOS FINS DE SEMANA, EU VESTIA JEANS COMO QUEM NADA NOS RIOS DE LEITE E MEL, E ACORDAVA NUMA ESPERANÇA PELO MENOS IRRITANTE.
HOJE, HOJE NÃO ME INCOMODA A ROTINA ADULTA, MUITO PELO CONTRÁRIO, MAS DEVO DIZER QUE ME MAÇA. QUE ME ACOSTUMEI ÀS MIUDEZAS DELICIOSAS DE UMA SEMANA FARTA, E NEM ESPERO MAIS AVIDAMENTE OS SETE PARA AS DEZENOVE, PARA DAR PARTIDA NO CARRO. MAIS: NÃO ME ENTUSIASMA MAIS, SEQUER ISTO, A MUDANÇA DOS CARROS.
MAS, JUSTIÇA SEJA FEITA, HOJE SOU MAIS SELETIVA COM O QUE LEIO - E COMO. O GOSTO TEM DE SER DE FATO MUITO FORTE, PARA QUE EU NÃO ME RETIRE. OS ADULTIMOS, CREIO, SÃO PRECISAMENTE ISTO: A MONOTONIZAÇÃO DAS ATIVIDADES DE QUE OUTRORA NÃO ME JULGAVA DIGNA. E HOJE, PARA QUE SE DÊ A DITA FUGA, SÃO NECESSÁRIOS MAIS DE DEZ MIL QUILÔMETROS, E SETE MESES. SENÃO OITO.
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CI SIAMO QUATTRO. E LEGGIAMO ASSOLUTAMENTE TUTTO. DOPO TRE O QUATTRO MESI. E CINQUE O SEI BICCHIERI. DI VELENO.